Acabamos de, finalmente, entrar no primeiro mundo por completo. Ou, pelo menos, de replicar todas as suas mazelas. Wellington Menezes de Oliveira, ex-aluno da Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, zona oeste da capital fluminense, entrou ali armado até os dentes nesta manhã do dia 07, abrindo fogo, matando onze crianças e se matando logo em seguida. Deixou uma carta, escrevendo coisas desconexas. Só faltava isso para conseguirmos imitar de vez os Estados Unidos! Chocados, não paramos de nos perguntar por que coisas assim acontecem. Pois bem, eu arrisco um palpite: pra mim, a culpa é do consumismo.
O grande problema da tal “pós-modernidade”, a era em que vivemos, é que, infelizmente, botamos todo nosso referencial no consumo. Zygmunt Bauman (1925 - ), sociólogo polonês, em sua definição de “modernidade líquida”, já dizia que, com a perda da tradição, do valor universal do mestre, as nossas subjetividades afloraram. Somos bombardeados diuturnamente com estímulos aos nossos desejos, muitos dos quais inalcançáveis e que geram uma profunda sensação de impotência. Fala-se em “ditadura da beleza”, promete-se a juventude eterna, criando uma legião de frustrados. E o pior é que não nos damos conta de que a mesma propaganda exibida nos lares do asfalto também o é nas favelas. Daí começam as distorções, o ódio e a barbárie daqueles excluídos do sistema, que tiram sua vida por uma joia, um carro, um tênis ou mesmo uma pedra de crack, uma das muitas substâncias usadas como forma de escapar à crueza da nossa realidade. É a força motriz da violência, é o dedo que toca a ferida, dentre tantos.
O mesmo problema da pós-modernidade também se observa em âmbito micro – e é aí que se encaixa melhor o porquê do massacre na escola do Rio de Janeiro. Impossibilitados, na maioria dos casos, de satisfazer a todos os nossos desejos de consumo, somos levados à frustração, à inveja e à infelicidade. Estratificamos, como na nação ianque, nossos conhecidos em loosers e winners, perdedores e vencedores, e discriminamos os primeiros, praticando o bullying, outra cópia maldita. Assim, pessoas com o mínimo de propensão ao desajuste, como Wellington, por exemplo, encontram campo fértil, em suas imaginações doentias, para a prática de atos como os que aconteceram hoje. É o nosso mundo fabricando neuróticos, pessoas desajustadas e incapazes de entender e respeitar o outro como ser humano, pois não conseguem buscar identidade numa sociedade tão fragmentada, tão carente de referenciais.
Infelizmente, zerar a violência é algo impossível. Até mesmo em sociedades muito mais desenvolvidas isso não existe! Mas, certamente, se quisermos mesmo ser os “Estados Unidos do Sul”, é bom que comecemos a copiar modelos positivos não só desta, mas de outras civilizações. Nova Iorque, com a política da tolerância zero e a promoção de ocupação para os jovens, diminuiu suas taxas de criminalidade; foram adotadas mochilas em material transparente, para facilitar a visibilidade de armas ou drogas; e os EUA, hoje, vivem no combate à obesidade, outro mal que também se alastra aqui. Não é difícil, basta apenas vontade política de querer o que é bom, e não apenas o consumismo estéril, a fragmentação da identidade e agora as tragédias em escolas. Yes, nós temos massacre.