domingo, 31 de julho de 2011

INFÂNCIA 80 – PARTE I

“Mãe, ganhei um Atari!”. A frase, se fosse dita há uns vinte anos, não teria nada demais. No entanto, eu disse isso semana passada, para uma mãe desesperada em saber o que fazer com aquela velharia! Pros mais novinhos, explico: Atari foi um videogame que fez a cabeça da garotada nos anos 1980, contando com “diversão em 2 bits”. Ganhei um, com um montão de cartuchos, de um colega de trabalho que quase jogou tudo no lixo. Sacrilégio! Antes de jogar fora um brinquedo, por que não fazer uma criança feliz? Mesmo que ela tenha mais de trinta anos...

Esse papo de infância sempre me faz lembrar da minha amiga escritora Marilena Soneghet. Em 2000, ela nos brindou com um deliciosíssimo livro de crônicas, chamado “Trança”, em que ela fala de uma infância de bondinhos, quintais enormes e portões abertos. Confesso que, em princípio, fiquei com inveja. Mas, pensando melhor, a minha infância não foi assim tão ruim, não. Foi mais urbana, com certeza, mas de uma cidade que ainda mantinha seus ares de província. Lembro-me, por exemplo, de uma Praia de Camburi ainda banhável, com um calçadão de pedras portuguesas, imitação da carioquíssima Copacabana, só que em miniatura. A faixa de areia era tão baixa que havia até uns degrauzinhos pra gente descer, além de um quiosque aqui e outro acolá, feito de concreto e toras de madeira.

Na frente da praia, havia um restaurante chamado Pirata’s, feito em forma de navio, totalmente kitsch como, aliás, foi tanta coisa naquela década de 80. A fachada era em pedra, subindo até uma espécie de mastro estilizado, em que um boneco fantasiado de pirata reinava soberano, sempre com um braço na luneta, olhando não-sei-o-quê. Deveria ser a Vale, na época, Vale do Rio Doce, lá do fundão. Enfim, era o fino do brega, mas a gente achava o máximo, que nem a Bambina ou a Toscana, onde havia um aquário marinho gigante e um peixe agulha que gostava de brincar de se esconder da criançada. A gente nem comia, só queria “brincar” com o peixe, fazendo o favor de cutucar o aquário com dedinhos sujos de gordura, pra desespero dos donos.

Não havia Shopping, mas um aterro enorme na Enseada, o chamado “Aterro da Comdusa”. Uma vez, houve uma exposição chamada “Eva, a mulher gigante”, com um boneco de uma mulher dentro da qual podíamos entrar e ver como funcionava o corpo humano. Já falei sobre isso, aliás, em uma outra crônica – e também que a Terceira Ponte ainda não existia, só os pilares, apelidados pelos locais de “Ponte do Gato”, porque nem sequer entravam na água. Não consegui ver a Eva por dentro, umas das minhas “frustrações de infância”, mas segui com meus pais dias depois pela ponte, pronta, aliás, no final daquela década. Era o “trânsito pesado” da capital, numa época em que a gente gastava uns 15 minutos pra chegar ao centro (ou à “cidade”, como se falava naquela época) e que Vitória e Vila Velha tinham uma espécie de “rixazinha” pra saber qual era a melhor.

O centro de Vitória, aliás, era menos violento e mais freqüentado. A Mesbla, por exemplo, tinha uma lanchonete-restaurante no segundo pavimento, chiquérrima, em que a gente almoçava quando ia fazer compras, já que a cidade não tinha Shopping, mas “Centros Comerciais”, como o Centro da Praia ou o Boulevard, erguido onde havia uma antiga maternidade (muita gente, literalmente, “nasceu no Shopping” aqui em Vitória). Hoje, meus alunos nem sabem o que é Mesbla, pra meu desespero... ah, tinha também a lanchonete das Americanas. Quem “catou” uma bala de lá, fique tranquilo, o “furto” já prescreveu! Não havia câmeras de segurança, só seguranças, mesmo, e no mínimo descuido... em tempo: ainda há a lanchonete ali e, se eu não estou enganado, com as mesmas atendentes. Tem coisas que resistem ao tempo...

O centro também tinha muitos cinemas: Glória, São Luís, Jandaia, Paz... ainda peguei o finalzinho dessa época. Lembro-me muito bem do primeiro filme a que assisti no cinema: foi “ET”, de Steven Spielberg, no Glória, com papai. Fomos de ônibus pois o “trânsito” da cidade era muito “complicado” pra que a gente encontrasse vaga pro Chevette da família. Consigo ouvir a música-tema do longa e sua abertura até hoje. Era a magia da tela grande, pela primeira vez, se descortinando frente os olhos de um menino de uns cinco anos. Foi em 1984, pois, naquela época, filme chegava com atraso. As fitas eram poucas e até um lançamento chegar por aqui...

Por falar em fitas, a “tecnologia” da época era um caso a parte: primeiro, os eternos e enormes “bolachões” (ou LPs), depois, os walkman, com seus fones gigantes e fitas cassetes, que, quando velhas, chiavam horrores. O chique da época, aliás, era ter um toca-fitas bem grande no carro e depois sair com ele na mão, em uma bandeja. Depois, o videocassete. Era o máximo, a gente podia gravar desenhos animados, numa época em que piratear não estava no dicionário. A tecnologia magnética, muito mais rudimentar que a digital, fazia de qualquer um, um “ás” da pirataria. Por falar em tecnologia, o telefone a disco foi substituído pelo de botões, um avanço e, como era caro ter uma linha! Tinha gente que vendia terreno pra comprar! Quem não tinha, apelava pros “orelhões” e tinha de ser rápido, senão a ficha caía. E no sentido denotativo da coisa, mesmo.

Voltando aos filmes, já gravei muito filme de locadora e muitos que passavam nos únicos quatro canais disponíveis: Globo, SBT (antes, TVS), Cultura e Manchete, o que significava, todo mundo via os mesmos filmes e desenhos animados – e os comentavam no dia seguinte, na escola. Eu, que estudava de manhã, perdia alguns, mas sempre que podia, via os “Thundercats”, “Transformers”, “Comandos em Ação”, “Smurfs” e “He-man” (“She-ra” era coisa de menina). De tarde, tinha “A Nossa Turma”, “Pole Position”, “Cavalo de Fogo”, as séries japonesas (“Changeman” e “Jaspion”), a americana “Punky, a levada da breca” e o eterno “Chaves”. E, no fim de semana, tinha a musiquinha do “Show de Calouros” do Sílvio Santos, que significava que o domingo estava acabando. Que tristeza!

Ainda não conectei o meu Atari “novo”. Para um videogame dos anos 1980, é preciso ter uma televisão dos anos 1980. Acho que aqui em casa tem uma. Estou louco pra jogar Enduro, Pac Man, River Rade, Fantastic Voyage, dentre outros tantos cartuchos que me esperam. Se, naquela época, esses jogos tinham gosto de diversão, hoje, eles têm o gosto de reminiscência, de uma deliciosa época que não volta mais. Hoje, décadas depois, percebo que não preciso ficar com inveja de ninguém, pois minha infância foi tão boa quanto qualquer outra por um simples motivo: ser criança é sempre muito bom, não importa a década. Bom é brincar, ter coleguinhas e muitas histórias pra contar, anos depois, como eu estou fazendo agora. São tantas, aliás, que acho que merecem uma continuação. Continua na próxima nostalgia.

domingo, 10 de julho de 2011

13 DE JULHO, DIA MUNDIAL DO ROCK’N’ROLL

Nascido no sul dos Estados Unidos da América dentre as décadas de 1940 e 1950, o rock’n’roll é um estilo musical de origem negra, proveniente de uma mistura entre o blues, o jazz e a country music, além de outros, como o gospel, o folk e o boogie-woogie. Dono de várias vertentes desde sua criação, o rock, como também é conhecido, já passou pelo rockabilly, pelo twist, pelo metal, pelo hard rock, até chegar ao chamado “rock farofa”, “rock de Seattle”, nu metal e tantas outras quanto se pode conceber! Em 1985, o cantor e compositor irlandês Bob Geldof juntou algumas das maiores bandas de rock da década para um concerto humanitário em prol das vítimas da fome da Etiópia, chamado Live Aid. A data, 13 de julho. Estava criado o “Dia Mundial do Rock”.

Filho de um ex-músico profissional, tudo tenho a ver com o ritmo. Cresci ouvindo, basicamente, rock’n’roll. Não que outros estilos não chegassem até a minha casa, mas o que imperava em nossos “toca-discos” era uma mistura de Elvis Presley, The Beatles, Rolling Stones e os brasileiros da “Jovem Guarda” (Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Wanderléa e sua turma). Também havia espaço para posteriores como “Os Pholhas”, “Os Fevers”, “Os Incríveis Internacionais” e para a trinca da década de 1970: Black Sabbath, Deep Purple e Led Zeppelin. Tudo isso fez com que, confesso, não saiba até hoje quase nada (ou absolutamente nada) de MPB. Anda, vira e mexe, sou motivo de piada por conta disso...

A minha paixão, no entanto, foi o rock da década de 1980. Internacional, obviamente. Brasileiro? Nem pensar! No máximo um Barão Vermelho ou um Capital Inicial, mas, o que tocava no meu LBT – A20 (“cinco-em-um” da Sony, presente de aniversário do meu pai, super moderno para a época e risível para a geração iPod de hoje em dia) eram o bom, velho e eterno Iron Maiden; Metallica (antes da fase do Black Album); Scorpions, Gamma Ray, Saxon, Angra, Def Leppard, Judas Priest e, de vez em quando, um Sepultura e um Mötorhead. Às vezes fazia concessões ao som “leve” de Guns’n’Roses, Bon Jovi, Europe e outros. Nunca gostei da Grunge music, sendo sempre fiel ao som oitentista.

Todas essas influências fizeram com que eu me enveredasse para o rock. Eram os anos 1990 e eu dava meus passos, concomitantemente, na música e na literatura. Sempre achei que as duas artes se combinavam. Utilizei-me de alguns versos de Iron Maiden para a epígrafe do meu primeiro romance, “Asas de Cera”, de 1995. Foi um escândalo para a época e cheguei até a parar no Caderno 2 de “A Gazeta”, em uma matéria sobre a banda. Tinha, então, tenros 16 anos e duas fotos preferidas: uma, que virou a orelha do livro e que ficava na parte de baixo da minha estante; outra, em que empunhava uma guitarra Gianini Fender Stratocaster preta-e-branca, semelhante à de Eric Clapton e que ficava na parte de cima. Puro jogo de cena: nunca passei de três acordes!

Minha relação com a música, aliás, sempre foi interessante: consumidor contumaz dos CDs da extinta loja “Tarkus”, da Praia do Canto, numa época em que nem se pensava em pirataria, resolvi arriscar. Como disse, comecei com a guitarra, mas logo vi que as cordas não eram muito comigo; então, migrei para o teclado. Fui até razoavelmente bem, mas, logo percebi que tocar não era muito a minha praia. Resolvi, então, fazer canto, com a minha eterna mestra Elaine Rowena e soltar uns agudos à la Bruce Dickinson. Como me divertia! Foi nessa época a primeira banda, que trocava de nome toda a semana: Metropolis, Metropolitan, Vektor, até parar em Silver Spirit. Com esta última denominação, lançamos nosso risível primeiro e único CD demo. Mal sabíamos tocar e já começamos “compondo”. Tenho-o até hoje. Nem consigo ouvir minha voz! Será que isso é bom ou ruim?

Ainda tenho guardado o LBT-A20. As duas fotos também continuam comigo, mas a do escritor, agora, está em cima e a do “roqueiro”, embaixo. Isso não significa que não goste mais de rock, mas, minha relação com ele se resume a ouvi-lo no carro, indo para o trabalho. Confesso que meu dial anda dividido entre notícias e até outros ritmos, como a música pop e um pouco de rap e hip-hop. Já me peguei ouvindo Shakira e Beyoncé. Lady Gaga, jamais! Acho, no entanto, que isso marca algo tradicional ao estilo: as “antigas” gerações vão cedendo espaço para as novas e o amor ao ritmo vai passando de pai para filho, de irmão para irmão. Foi assim comigo. É por isso que sou completamente contra essa discussão sobre o fim do rock’n’roll. Enquanto houver um garoto idealista, como fui eu, o estilo continuará vivo. Rock não precisa de propaganda – ele mesmo se propagandeia. Por isso, neste 13 de julho, eu e toda a nação roqueira gritamos bem alto: long life to the rock’n’roll!