domingo, 19 de setembro de 2010

DISCURSO DE POSSE NA AEL (última parte)

Vivemos hodiernamente em um momento crucial não apenas para as artes em geral, mas, especialmente, para a Literatura. Na primeira década deste século que se deslinda diante de nosso olhos, termos como homepage, blog, orkut, facebook, twitter e tantos outros não são mais o futuro, mas sim o presente neste mundo da contemporaneidade, redefinindo, dentre tantas coisas, o papel do escritor e do livro. A “revolução virtual”, aliás, já se encontra ínsita na realidade dos grandes intelectuais. Qualquer autor, por menor que seja, possui, pelo menos, um perfil em uma rede social ou, até, uma homepage. O e-mail substituiu toda a correspondência epistolar enquanto editoras virtuais oferecem seus produtos num simples clicar de um mouse. O livro se reinventa, com os tão polêmicos e-books, cada vez mais presentes no mundo desenvolvido e ainda novidade no mundo em desenvolvimento, levantando a polêmica do futuro desse meio de comunicação. E tudo se reinventa neste admirável “mundo do efêmero”, em que “tudo o que é sólido se desmancha no ar”.

É neste contexto que um jovem escritor toma assento em uma tradicional Academia de Letras...

A inovação é uma das marcas da Literatura produzida no Espírito Santo, apesar de ser uma das mais antigas produzidas em nosso país, iniciando sua fase Brasil pelas mãos do padre José de Anchieta, espanhol radicado em nosso país e, sobretudo, um amante das terras capixabas, pioneiro no estudo e sistematização da língua tupi-guarani. Nossa literatura também tem destaque com nomes de vanguardistas como Haydée Nicolussi, Mendes Fradique, Renato Pacheco, Xerxes Gusmão Neto, Audífax Amorim, Amylton de Almeida, Carmélia Maria de Souza e tantos outros que imprimiram a marca da diversidade cultural capixaba, nossa característica, nossa identidade, que transformaram o Espírito Santo nesse verdadeiro “Albergue dos Querubins”, como no livro de Adilson Vilaça.

Não poderia ser diferente com a Academia Espírito-Santense de Letras. Criada em 4 de setembro de 1921 por Alarico de Freitas, Sezefredo Garcia de Rezende, Elpídio Pimentel, Dom Benedito Paulo Alves de Souza e Thiers Velloso, ela já trazia no gérmen de sua criação a marca da modernidade – a juventude de alguns dos seus membros-fundadores. Ainda que inspirada no clássico modelo da Académie Française, de quarenta cadeiras que levam o nome de grandes vultos da história espírito-santense, os patronos, a Academia Espírito-Santense de Letras sempre tentou aliar a tradição à modernidade, o passado ao futuro, ao acolher a Academia Espírito-Santense dos Novos, nos anos 1930, ao acolher a Academia Jovem Espírito-Santense de Letras, no século XXI, ao firmar convênios com entidades culturais, ao resgatar a memória da litertura de nosso Estado para as futuras gerações, num labor mantido ao longo desses quase 90 anos de história!

A minha entrada nesta arcádia constitui-se, portanto, em mais um desdobramento desse vanguardismo. Apaixonado por Literatura desde a tenra idade, mas, sobretudo, por literatura capixaba, entristeço-me ao saber que, por exemplo, já nos idos de 1982, o professor José Augusto de Carvalho escrevia na “Revista de Cultura da Ufes” que a literatura capixaba não existia, vegetava. É por isso que ofereço, aqui, meus braços para ajudar em tão nobre causa. Sei que sou apenas um jovem escritor, idealista, apaixonado, mas assumo aqui, perante os meus pares, perante as senhoras e senhores, o meu compromisso em não apenas continuar este legado, mas o de honrar a instituição da qual passo a fazer parte oferecendo a minha militância de tantos anos nas trincheiras das Letras de nosso Estado, começada precocemente, ainda na minha adolescência.

Enquanto acadêmico, quero de ser o arauto dessa nova era, trazendo a novidade para o seio de nossa instituição. Comprazo-me em ver a Academia inserida nessas novas mídias às quais me referi, como o twitter, como o facebook, mas precisamos de mais! Sei que temos muito o que fazer, mas os meios estão todos aí, em nossas mãos. Precisamos de uma homepage, precisamos nos utilizar de todas as ferramentas de que dispomos para continuar o diálogo entre nossa instituição e a sociedade. Esta é a prova, aliás, de que não vivemos ensimesmados, mas atuantes, como uma instituição de fomento à cultura do Livro, tal como descrito, aliás, em nossas disposições estatutárias, tal como brilhantemente legado pela diretoria que se vai àquela que começará, certamente, com muita competência.

Enquanto capixaba, gostaria de fazer dessas singelas palavras um manifesto em prol da nossa Literatura. Precisamos nos unir, mais do que urgentemente, em torno da beleza de nossas Letras. Somos a mistura de raças, somos a beleza do congo, dos pomeranos, dos italianos, dos indígenas; das violas e das concertinas; dos quilombos e das tarantelas; dos versos de Elisa Lucinda, de Geir Campos; das crônicas de Rubem Braga, só para citar aqueles que conseguiram furar o cerco e levar a beleza desse Estado chamado Espírito Santo para fora de nossas fronteiras. Assim, espero eu estar vivo para poder ver a profecia de Francisco Aurélio Ribeiro se concretizar, quando, no livro “A Literatura do Espírito Santo – ensaio, história e crítica”, ele disse “Nós aqui somos bons; temos a vantagem de esbanjar talentos até com amor às letras. Temos, agora, literatura. Boa brasilidade é conhecer, também, o que fazemos aqui”.

Encerro minha fala sem poder deixar de agradecer. Gostaria de começar pelos meus pais. Quem, sem o aplauso doméstico, poderia ir além? Quem, sem as mãos delicadas da mãe ou as mãos firmes do pai, poderia aprender a passar as páginas de um livro ou segurar um lápis ou uma caneta? Devo muito a vocês, papai e mamãe, que me passaram o gosto pelo Livro, numa amostra de que são vocês, pais, os primeiros e os mais importantes educadores. Do meu pai, herdei a cultura jurídica, o meu ofício de advogado; da minha mãe, o gosto pelo magistério. Tive a sorte de tê-los, ainda hoje, como meus maiores professores e inspiradores. Tenho orgulho disso. Tenho muito orgulho de vocês.

Gostaria de agradecer aos meus professores e professoras, tão importantes na continuidade da minha formação. Tenho orgulho de ser também um de vocês, mas também tenho orgulho de lecionar nesta casa chamada Aliança Francesa de Vitória, a qual considero minha segunda casa, ma deuxième maison, dirigida pela figura da professora Darcília Moysés e cuja presidência é detida pelo Dr. Samuel Malheiros. Merci à vous, merci de m’avoir parmi vous. Merci de toutes ces années.

Gostaria de agradecer aos meus colegas acadêmicos, aos votos de confiança que ganhei de todos. Assumi um compromisso, por meio de uma carta que escrevi a todos, de doar-me a esta instituição. Reforço-o aqui, nesta noite, em que sou rebatizado com um dos seus e fazer parte deste tão honroso panteão!

Gostaria de agradecer aos amigos e familiares pelo apoio de sempre, mas, sobretudo pelos laços de amor, combustível sem o qual pena alguma se moveria em meio a uma página em branco.

Mas principalmente, gostaria de fazer um agradecimento especial a Deus Nosso Senhor. Vítima de um acidente gravíssimo, há um ano, no dia 7 de setembro de 2009, encontro-me aqui apenas e tão-somente por causa d’Ele. Desci aos pélagos mais profundos, conheci a “mansão dos mortos”, mas ressuscitei, por meu turno, não no terceiro dia, mas no terceiro mês, com a graça do Pai, que me proporcionou essa dádiva para que eu pudesse escrever o meu singelo “A História de um Sobrevivente”, cujo lançamento faço hoje. Encho-me de júbilo, pois sei que doravante fecho um ciclo para abrir outro. A partir de hoje, Deus, que me tirou dos braços da morte, coloca-me de mãos dadas com a Imortalidade!

Muito obrigado.



O livro "A História de um Sobrevivente" -  bem como os outros livros da minha bibliografia - pode ser adquirido na rede de livraria Logos da Grande Vitória/ES e, em breve, pelo site da mesma livraria.


2 comentários:

  1. Parabéns Anax!! belo discurso
    Eu estou na labuta com o meu...
    Te parabenizo pela garra de dar volta por cima e reconstruir a vida após o acidente, sei como é isso pois em 2000 eu vinha do RJ e o onibus em que eu estava capotou e caiu de uma ribanceira de 20m. levei 2 anos para me recompor, bem, como mosaicista tornei-me a propria obra, e fui colando os caquinhos, um a um... É sempre uma possibilidade de recomeço acontecimentos assim...
    novamente parabens
    abraçoamigo
    Renata bomfim

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  2. MEU BOM ANAX!
    ESSE DISCURSO É UMA BELA PEÇA LITERÁRIA: REPLETO DE EMOÇÃO E ESTILO!
    SUA FORÇA INTERIOR É IMPULSIONADA PELAS MÃOS DIVINAS!
    PARABENIZO-O PELAS CONQUISTAS: HONRA AO MÉRITO!
    UM FRATERNO ABRAÇO,
    EDSON LOBO

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