segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O MEU ÚLTIMO VEXAME

Nunca gostei de circos. Acho que é trauma. Lembro-me que, da última vez em que fui, lá pelos idos de 1982 ou 1983, um leão, passeando pelo picadeiro, levantou a perna e fez xixi em cima de um senhor e de seu netinho, respingando na minha mãe e em mim. Aquilo pode ser considerado como uma espécie de batismo – ou advertência, para jamais pôr os pés em um lugar desses de novo. Desde então, comecei a detestar palhaços, exceção feita para o Bozo, talvez porque ele ficasse do lado de lá da tela da televisão e eu no lado de cá; também comecei a desenvolver um quadro muito parecido com mágicos, com ressalvas ao Mister M. Adorava vê-lo contar o segredo dos mágicos. Era minha vingança pessoal contra todos eles!

Infelizmente, o mundo dá muitas voltas e, se um dia eu consegui escapar do leão, outro dia, certamente, não conseguiria fugir do mágico. E esse dia foi há algumas semanas. Foi no meu trabalho, na abertura de uma premiação. Um mágico embusteiro escolheu algumas pessoas para auxiliá-lo e, obviamente, eu fui um dos “agraciados”. Ainda cheguei a comentar com uma colega de trabalho que eu seria a próxima “vítima” do prestidigitador. Dito e feito! Ainda tentei virar a cabeça, abaixar os olhos, mas ele foi se chegando mais perto, cada vez mais perto, muito mais perto... até parar do meu lado! “Você, gostei de você”. Como poderia correr dali? Sei lá, mas acho que tenho um alvo pintado na testa... Em suma: mais um vexame para minha (extensa) coleção...

Aquela “eterna experiência” de alguns “minutos” serviu para me ensinar duas coisas: a primeira é que qualquer um pode ficar tímido. É incrível a timidez... ela é como um juiz (muito) rigoroso que prolata uma pesada sentença, pesada demais para ser cumprida. Digo isso porque eu me considero uma pessoa muito extrovertida, mas, na hora, confesso, me deu um “branco” como se diz por aí. A sensação é horrível: o tempo não passa, você não sabe onde pôr as mãos, não sabe para quem olhar, não sabe o que fazer, não sabe de nada! O mágico, para piorar a situação, resolveu fazer um “improviso” com “cartas de baralho”. É óbvio que eu sei a diferença entre um dois de paus ou um ás de copas, mas quem disse que eu consegui distinguir uma coisa da outra na hora?

A segunda coisa que eu aprendi foi a sensação do vexame. Na verdade, foi um reaprendizado, pois, quem nunca passou por uma situação vexatória na vida? É como uma comichão que vai tomando conta do corpo inteiro, de uma hora para a outra. Você vai se sentindo quente e, ao mesmo tempo, o corpo vai endurecendo. A única coisa que você quer é que uma cratera bem grande se abra na sua frente e que você caia na China ou qualquer lugar que o valha. Como já disse, o tempo não passa, definitivamente, comprovando a teoria de Einstein, e as mãos tremem desesperadamente... você sente vontade de correr, mas as pernas não obedecem. E quando a coisa toda acaba, dá vontade de se desmaterializar do local e ficar fora um mês, até que todo mundo se esqueça do acontecido. Fazia tempo que não me sentia assim...

Creio que ele fez a mágica errada. Ao invés de cartas, ele poderia ter feito com que eu desaparecesse do palco. Seria mais apropriado. Em saber que tudo isso começou com um xixi de leão, lá nos anos 1980... enfim, sou da mesma opinião do pai de uma colega de trabalho, que diz que a gente vai nesse tipo de lugar para rir, e não para “ser rido”. E eu o fui do diretor presidente ao contínuo... Não preciso nem dizer o que meus colegas de trabalho fizeram depois... em todo caso, se você, que está lendo essa crônica, for palhaço, mágico ou domador de leão, como dizem meus alunos, nada pessoal mas faça-me um favor: vê se “me erra” da próxima, tá bom? Pelo amor de Deus!



Anaximandro Amorim,
Escritor e membro da Academia Espírito-Santense de Letras,
Cadeira 40.

6 comentários:

  1. Anax, há tempos não me divertia tanto. Vc a cada dia se supera, meu amigo. Parabéns. E quando vir um mágico, palhaço ou algo do gênero, não foge não!!! Quero ler outras histórias como essa rsrsrs. Não deu para ir no encontro de turma. Uma pena. Saudades. Mari.

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  2. Se eu fosse palhaço, mágico ou domador de leão sem duvidas não "te erraria", só para ter o prazer de ver você brincando com as palavras assim novamente... (sou uma leitora assídua e silenciosa, saiba). Beijinhos

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  3. Anax, adorei! Ri muito lendo, muito divertida a sua narrativa.
    Sei que já virou clichê, mas Parabéns mais uma vez.
    Beijos
    p.s. Não gosto de circo, acho um saco!

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  4. Se serve como consolo, eu tb nao gosto de circo, como a Delma acima, tb acho chato!

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  5. Olá Anax!! estou te presenteando com um Selo. Dá um pulo lá no Só Palavras!
    Abraços....

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